Tendências recentes em alguns círculos acadêmicos tem levantado questões
sobre noções convencionais da verdade e realidade. A alegação feita nestes
círculos é que todas as declarações, seja na ciência ou na literatura, são
simplesmente narrativas -- contos e mitos que fazem nada mais do que articular
as opiniões pré-concebidas do narrador. Neste ponto de vista, uma narrativa é
tão boa quanto a outra, uma vez cada uma é expressa na linguagem de sua cultura
particular e assim contêm todas as pressuposições sobre a verdade e a realidade
embutidas nesta cultura. Os textos não tem qualquer significado intrínseco. Mais
exatamente, seus significados são criados pelo leitor. As conclusões são então
conduzidas de modo que nenhuma narrativa pode ter validade universal e que a
ciência "ocidental" não é uma exceção.
Os estudantes universitários de hoje, nos Estados Unidos e em qualquer outro
lugar, ouvem esta linha de raciocínio de muitos de seus professores de ciências
sociais e humanas. Proponentes da "medicina alternativa" freqüentemente usam
argumentos similares para rejeitar a ciência como um método de determinar
verdades relacionadas à saúde.
A afirmação de que a ciência "ocidental" não é excepcional começa com uma
noção plausível, apesar de que ultimamente corrompida, de que nós humanos
carecemos de acesso a qualquer mecanismo pelo qual possamos descobrir a verdade
sobre uma realidade objetiva que existe independente dos processos mentais
humanos. Certamente, a ciência conta com os processos mentais e nem sempre segue
um caminho claro, lógico para chegar a conclusões que faz a respeito da
realidade. Realmente, nunca prova a exatidão destas conclusões. A ciência não
têm certeza de nada sobre o mundo e deve sempre expor seus resultados em termos
de probabilidades ou indícios. Freqüentemente a escolha entre teorias
científicas competitivas é baseada na preferência, moda ou noções subjetivas de
simplicidade ou apelo estético.
De acordo. Os cientistas podem nunca ter certeza da "veracidade" de suas
teorias. Todavia, as previsões das teorias científicas são muito freqüentemente
suficientemente próximas da certeza que nós todos confiamos nossa vida nelas,
como quando estamos em um avião ou em uma mesa de cirurgia. Quando as previsões
são tão fidedignas, podemos racionalmente concluir, se não provar, que os
conceitos nos quais estão fundamentadas devem ter alguma validade universal. Ou
seja, devem de alguma forma estar conectadas com a maneira com que as coisas
realmente são.
Por exemplo, não podemos prever com certeza absoluta o que irá acontecer se
pularmos de um edifício alto. É sempre possível que possamos cair em um cesto de
penas que, por sorte, simplesmente veio a se projetar de uma janela no andar de
baixo. Entretanto, baseado na lei da gravidade, podemos prever com alta
probabilidade que passaremos por aquele andar e acertaremos o chão de uma forma
nada saudável. A lei da gravidade foi testada o suficiente com experimentos para
seguramente concluir que o conceito de gravidade é "real".
A realidade age para reprimir nossas observações sobre o mundo, prevenindo ao
menos que algumas destas observações sejam completamente aleatórias, arbitrárias
ou simplesmente da maneira que gostaríamos que elas fossem. Apesar de que muito
do que realmente observamos é aleatório -- mais do que a maioria das pessoas
percebem -- não são todas as coisas. E ainda que nós humanos possamos exercer um
certo controle sobre a realidade, mesmo assim a realidade não é meramente a
criação de nossos processos mentais. Quando sonhamos que estamos saltando de um
prédio, podemos flutuar até o chão sem se machucar. Quando pensamos que estamos
saltando de um prédio, podemos imaginar qualquer coisa que quisermos a respeito
do desfecho. O super-homem pode voar para nos salvar, em nossas fantasias. Um
avião com um colchão em suas asas pode aparecer no último minuto. Mas, na
realidade, caímos no chão não importa o quanto possamos desejar o oposto.
Sem ficar muito pedante a respeito da definição da realidade, deixe-me apenas
dizer que nossas próprias observações da vida cotidiana deixam muito claro que
nós e os objetos ao nosso redor somos sujeitos a coações impostas externamente
que nem nós nem os objetos podem controlar completamente. Se pudesse controlar a
realidade com meus pensamentos, gostaria de ter a mesma aparência que tinha
quando estava com vinte anos e ainda ser tão esperto como sou agora. Mas não
posso. Na ciência, usamos nossas observações sobre o que acontece quando não
estamos sonhando ou fantasiando para fazer inferências razoáveis sobre a
natureza do que fornece o ímpeto para as coações que gravamos com nossos
aparelhos de mensuração.
A física moderna solidamente sugere uma "realidade definitiva"
surpreendentemente simples, não misteriosa que pode não ser o que desejaríamos
que fosse, mas é corroborada por todos dados conhecidos. Além disso, esta
realidade é muito mais parecida com o que foi inferido por alguns dos pensadores
mais notáveis no mundo antigo: um universo composto de objetos elementares que
movem-se ao redor de um espaço que fora isto está vazio. Chamo isto de realidade
atômica.
Esta proposição vai contra a moda atual. Essa moda que repudia todas as
tentativas, de dentro da ciência ou sem a ciência, de descrever uma realidade
objetiva, universal. Repudio esta moda. Onde a validade de certos conceitos
antigos e modernos da verdade e da realidade são negados, eu os ratifico. Onde
são feitos argumentos de que a ciência ocidental não nos conta nada de
significado profundo, asseguro que permanece como a nossa principal ferramenta
para a descoberta de verdades fundamentais.
Muitos professores de ciências naturais, com suas atenções voltadas
principalmente para as pesquisas, ignoram os ataques sobre a ciência e o
pensamento racional. Quando têm a oportunidade de ouvir asserções de que a
ciência é apenas outra história extravagante, eles tipicamente refutam a noção
considerando-a um absurdo. Ao invés, eles deveriam estar falando abertamente a
respeito.
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Dr. Stenger é
professor de física e astronomia na University of Hawaii. Recebeu o grau de
doutor da UCLA em 1963 e tem tido uma carreira ativa de pesquisa em partículas
elementares da física e astrofísica. Seus projetos tem incluído a elaboração das
propriedades dos quarks, gluons, neutrinos, violação de CP e a corrente neutral
fraca. Trabalhou na astronomia de raios gamas de alta energia e de neutrinos. É
atualmente um colaborador no Super-Kamiokande, um experimento em uma mina no
Japão que recentemente confirmou a anomalia do neutrino solar e espera-se que
seja o experimento mais definitivo da década sobre neutrinos solares, decaimento
de prótons e oscilações de neutrinos. Seus trabalhos incluem muitos artigos para
publicações céticas e três livros publicados pela Prometheus Books: Not By Design:
The Origin of the Universe Physics (1988); Psychics: The Search for a
World Beyond the Senses (1990); e The Unconscious Quantum: Metaphysics in
Modern Physics and Cosmology (1995), o qual o Suplemento de Literatura da
Times descreveu como "uma tentativa interessante, provocativa, informativa e
apaixonada para resgatar a física das apropriações contemporâneas não
científicas ou anti-científicas de sua teoria."